Entrevista: Justine Taylor

Texto originalmente postado por SG no FaceBeatIt, em 31 de Janeiro de 2017. Link.
Tradução livre feita pela equipe qBR com adaptações, sob autorização.
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Ryan Sparks da FBI, sentou recentemente para um bate papo com Justine Taylor, Artilheira/Chaser dos Los Angeles Gambits, para discutir sobre sua história esportiva, sua tomada na atual representação de inclusividade na comunidade e seus objetivos para o futuro da carreira dentro do quadribol.

Ryan Sparks: Então, cá estou com Justine Taylor—campeã da Regional Oeste da USQ, reserva do time nacional USA em 2016 e considerada uma das atletas topzera no esporte. Justine, como você está?

Justine Taylor: Estou muito bem, obrigado.

RS: Fico feliz de ouvir! Como mencionado antes você recebeu muitos elogios no seu curto tempo dentro do esporte. Você é uma classe especial dos atletas atuais. O que essas realizações, esses rótulos significam para você?

JT: Vencer as regionais oeste com os Gambits, foi de longe a melhor e mais complete conquista que eu já experienciei durante todo meu tempo no esporte. Com toda honestidade, no entanto, no que diz respeito a títulos e elogios, e reconhecimento é legal e tudo mais, não é o motivo de eu jogar, sabe? Eu não tenho um título do Campeonato nacional no bolso ainda e que é o objetivo final e isso é tudo que importa para mim.

RS: Falou com uma verdadeira competidora. Você sempre foi assim dedicada como atleta?

JT: Ah sim, minha vida toda. Esportes são uma grande parte da minha identidade—tem sido desde que eu me lembre.

RS: Quais são suas maiores conquistas atléticas enquanto crescia?

JT: A maioria das minhas conquistas vieram no ensino médio (high school). Eu estava em um time de atletismo que ganhou três vezes consecutivas o campeonato estadual, mesmo que eu não tenha muita responsabilidade nisso. Nós tínhamos um esquadrão de mulheres “badass”. Eu também fui muito bem nas provas de cross country, no mesmo período, e quando eu era mais nova, eu bem competitiva no futebol, natação e basquete. Eu meio que fiz de tudo um pouco para ser honesta.

RS: Onde você morava nesses anos?

JT: Eu cresci em uma cidade super pequena no centro do Arizona, chamada Cornville, e sim, eu ouvi todos os tipos de piadas relacionadas com milho que existem, então nem pense nisso.

RS: Não consigo imaginar um lugar como Cornville ser conhecida por sua diversidade racial.
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Photo: Sofia de la Vega Photography

JT: Ah não, nem perto. Digo, é Arizona, então tínhamos uma população Latina no ensino médio, mas eu fui a única criança negra na minha escola por um bom tempo.

RS: E como era, ser a única criança negra na sua escola?



JT: Você sabe—para ser honesta, por um longo tempo, eu nem notei. Eu não pensava sobre cores quando criança. Mas quando cheguei na 5ª série—é triste lembrar disso—nós estávamos lendo Huckleberry Finn e lembro de todas as crianças brancas ficarem me encarando porque eu era a única criança negra na sala. Na 6ª série, um dos meus colegas me chamou daquela palavra com “n”, e acho que foi nesse momento que eu acordei para o fato que eu era, legitimamente diferente e não poderia fingir ser de outra forma mais. Dali em diante eu progressivamente fiquei mais e mais inconfortável com minha cor de pele e minha relação com o mundo por causa disso.

RS: Qual foi o efeito do atletismo no seu relacionamento com sua cor ou o resto do mundo?

JT: Quanto mais velha eu ficava, mais crucial foi o atletismo para minha sanidade. Esportes foram uma espécie de fuga. Pois independente de como eu me sentia sobre minha pele e como eu parecia e como o resto do mundo se sentia sobre mim, aqui tem uma coisa que eu sou inegavelmente boa—independente de toda porcaria que acontece no mundo a fora, uma vez que eu alcance a pista de corrida, eu não posso ser parada, sabe? As vitórias nas Olimpíadas de 1936 do Jesse Owens sempre ressoaram em mim porque, em um tempo quando Hitler perpetuava uma cultura onde pessoas como Jesse eram inferiores, ele foi lá provar que era uma força a ser reconhecida. Isso sempre me trouxe forças.

RS: Então você é tipo o Jesse Owens de Cornville?

JT: Bom, eu não conseguiria ir tão longe, mas uma garota pode sonhar.

RS: Falando em sonhos, conhecendo a comunidade do quadribol, você deve ter se sentindo um presente dos deuses, com uma reputação de ser uma das comunidades mais inclusivas nos esportes.

JT: Certamente foi. Não quero parecer dramática, mas sabia no momento que fui ao meu primeiro treino que era perfeito para mim. O quadribol—e a comunidade que vem junto—é o único lugar no mundo que eu não tenho que me lembrar que sou negra. Não é que eu esteja tentando esquecer, ou que eu não gosto de pensar nisso, não me entenda mal, mas quadribol é uma comunidade onde a forma que sou tratada ou que interagem comigo não é ditada pela minha cor de pele.

RS: Eu sinto o mesmo a respeito do meu gênero. Dito isso, algumas vezes eu ainda passo por experiências onde as pessoas me tratam diferente porque sou trans. Tem alguma experiência ou pressão que você viveu como mulher negra no quadribol?

JT: Acho que as pessoas são micro agressivas por natureza; as pessoas não necessariamente reconhecem que estão me tratando diferente. Mas aí que está: por todos os esforços e intenções, o quadribol é um esporte muito acessível. Não é como o basquete onde tudo que você precisa é uma bola e um parque público, ou cross country, onde só precisará de um par de tênis. Não me entenda mal, não é o mais caro dos esportes no mundo, mas eu não acho que isso seja coincidência—na costa oeste pelo menos—a maioria das escolas que começaram times de quadribol são instituições com bons fundamentos ou escolas privadas chiques.
Acho que esse é o problema, por mais aceitável que a comunidade seja, ainda atende muito pessoas brancas, de classe média. Esse é a base que muitos desses jogadores estão vindo, então enquanto a comunidade está se esforçando pela inclusão, surge de um lugar que não tem uma compreensão genuína. O que é realmente difícil de obter, para ser honesta.
Mas no mesmo tempo que a pressão vai, o quadribol está anos luz longe das experiências que tive nos esportes do ensino médio, onde as atletas que eram mulheres fortes geralmente eram masculinizadas. Isso nunca foi uma experiência que tive no quadribol, o que é incrível, por que é um estigma que precisa acabar logo.

RS: Concordo completamente. O que você acha que pode ser feito para aumentar a compreensão que muitas vezes falta no esporte?

JT: Honestamente, isso é bem difícil. Muito disso vem de uma imersão de cultura que é alheia e não familiar para nós. Mas nem todo mundo tem essa oportunidade, então penso que a coisa mais importante é uma conversa aberta e honesta. Eu falei com muitas pessoas brancas que tem medo de perguntar ou conversar comigo ou outros SOP. Eles têm medo de parecer ofensivos ou de acabar insultando, mas é dez trilhões de vezes pior seguir em frente com um mundo perpetuando ideias falsas ou estereótipos. Tipo, olha, se você fizer uma pergunta estúpida ou ignorante, eu não vou ficar brava. Eu talvez ria de você um pouco por ter acreditado em algo muito idiota, mas eu não ficarei braba.

RS: Nesse quesito, considerando particularmente seu lugar na elite do esporte, você se vê como um modelo para os outros?

JT: Para ser perfeitamente honesta, eu só faço o meu melhor para enfrentar a mim mesma a estar engajada em conversas abertas com indivíduos que são diferentes de mim mesma, e desafio meus próprios conceitos. Se isso encoraja outas pessoas a fazerem o mesmo, isso é incrível. Eu estou aqui apenas para fazer meu jogo e ajudar o esporte a crescer, de qualquer forma que eu puder.  Eu não sairei do meu caminho para educar as pessoas ao menos que elas venham procurar por isso, porque no final do dia é a responsabilidade de cada um educar a si mesmo.

RS: Mais que justo. Aqui vem uma pergunta participar que eu queria terminar, que eu mesma acho uma questão fascinante: quando chegar a hora de pendurar as chuteiras, como você que as pessoas lembrem de você?

JT: Essa é uma ótima pergunta. Competitivamente, não tenho dúvidas que seria ser lembrada como a melhor artilheira de todos os tempos, mas estou mais que ciente que falta muito trabalho a ser feito para chegar lá. Mas de uma perspectiva mais ampla, eu realmente gostaria de ser lembrada como a jogadora que estava disposta a deixar seu coração e alma em campo, e pôr a mão no fogo pelo bem do time. Esse esporte significa mais para mim do que corridas jamais serão, porque quando eu estou lutando em campo, ou treinando fora dele, eu não estou fazendo isso por mim mesma.

RS: E hey, porque se limitar a ser apenas a maior artilheira de todos os tempos? Se sua história até aqui é uma indicação, não há nada que vai parar você de ser uma das melhores.

JT: Hey, quem sabe? Eu não vou fugir de nenhum desafio.

RS: Isso que eu gosto de ouvir. Obrigado pelo seu tempo!

JT: Qualquer coisa, estamos aí! (
ou quase isso)

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